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A voz de La Trisha


O mês do Orgulho está chegando ao fim, e nada melhor do que uma entrevista com um artista membro da comunidade LBTQIA+ para fechar com chave de ouro.


Foto: Vitor de Freiras

A La Trisha é um projeto criado por Thiago Costa Moreira. Nascido em Porto Alegre, o DJ gaúcho de 31 anos demonstra maturidade, bom humor e irreverência na forma com que se comunica e também no seu trabalho. E são com essas qualidades, misturadas com muito talento, que Thiago usa sua arte para celebrar a comunidade que está inserido, e também quebrar as barreiras impostas pela sociedade.


Conheça na entrevista abaixo La Trisha, que ganhou vida em 2019 e está conquistando cada vez mais seu espaço na cena musical.


1 – Como você começou o seu trabalho como DJ? Você sempre tocou música eletrônica?


Sempre curti música eletrônica, mesmo quando conhecia muito pouco dos estilos e do meio, mas com 17 anos, quando saí do armário, comecei a frequentar festas eletrônicas do cenário LGBTQIA+ e surgiu a oportunidade de fazer um curso com um DJ conhecido na cena. Com a ajuda e incentivo do meu namorado da época, fiz o curso que me ensinou o básico para um DJ de música eletrônica. Depois disso acabei conhecendo algumas personalidades da noite porto alegrense como Madblush a quem tive o prazer de ajudar na produção de algumas festas. Quando a faculdade me apertou o tempo e entrei para duas cias de dança, meu know-how acabou sendo usado muito mais para edição das trilhas sonoras dos espetáculos que eu dançava. Depois que me formei e parei de dançar, estava pensando em voltar às pick-ups com um projeto de EDM, mas eu não sabia o porquê de não conseguir tirar o projeto do papel. Toquei algumas vezes e cheguei a gravar um set, mas ainda não sentia que estava bom. Aí eu comecei a conhecer a cena eletrônica LGBTQIA+ de outras cidades do país e ter mais contato e gostar mais de tribal house. Brilhou pra mim a ideia da La Trisha e percebi que precisava me atualizar e me renovar nos conhecimentos da profissão DJ. Fiz uma pesquisa e decidi fazer um curso com metodologia bem construída na AIMEC e levar a La Trisha para as pick-ups de tribal house num conceito totalmente diferente.


2 – Como surgiu o projeto La Trisha?


Voltando de uma viagem maravilhosa de ano novo de Balneário Camboriú com passagem por Florianópolis e tendo conhecido o trabalho de DJs incríveis por lá, estava dirigindo enquanto meus amigos dormiam, comecei a pensar no projeto de EDM que estava tentando tirar do papel. De repente me veio a ideia de fazer um projeto paralelo de tribal house que poderia dar certo. Comecei a pensar sobre o que já tinha visto dos DJs e o que eles apresentavam e via que era muito fácil que eu caísse no mais do mesmo sendo mais um boyzinho padrão com um fone nas orelhas. Até aí tá tudo bem, mas eu não queria isso. Queria ser alguém que carregasse não só o som, mas uma imagem que fosse forte. Já tinha visto boys malhados, drags, personagens variados... mas queria algo diferente. Pensei no que ainda não tinha visto e percebi a falta de uma gay pintosa que abraçasse tudo que a heteronormatividade e até parte da comunidade condena do gay afeminado. Uma gay que juntasse maquiagem, salto alto, cropped, glitter, neon, leque, bandeira do vale e tudo mais que a sociedade caracteriza como “muito gay”. Achei meu personagem! Ele só precisa de um nome. Então depois de pensar em algumas possibilidades, cheguei ao conceito da bicha mais que bicha: Trisha! Chamei um amigo que eu sabia que me ajudaria a construir a imagem da La Trisha e ele já me cortou direto dizendo que não ia me ajudar com um “projeto paralelo” e que se eu realmente quisesse investir muita energia e vontade pra que essa ideia fosse concreta, fosse profissional e desse certo, aí sim ele me ajudaria como eu esperava. Depois dessa afronta necessária, veio do Vale dos Homossexuais para o mundo, a La Trisha.


Foto de quando La Trisha tocou em uma festa na Victoria Haus, famosa boate de Brasília. Foto: Instagram do artista.


3 – Sabemos que o preconceito é muito presente não só fora, mas também dentro da comunidade LGBTQIA+. Como você lida com isso?


Quando criei a La Trisha, já imaginava o que eu estava levando “de brinde”. Olhares tortos, julgamentos, preconceito... Nada disso é novo pra mim conhecendo o meio. Sabia que talvez perdesse alguns trabalhos em função da imagem, que talvez não entendessem a proposta e julgassem que eu estivesse ocupando um lugar de fala ou que talvez tivesse dificuldade para inserir a ideia por não conseguir mostrar trabalho, mas resolvi dar a cara a tapa porque acreditei que o projeto tinha uma função forte e importante de expressão e confiei que as pessoas que estavam a minha volta iam me dar apoio e acreditar no projeto assim que eu mostrasse o quanto eu estava disposto a fazer ele existir e dar certo. Acho que essa vontade e ambição que eu construí na La Trisha acaba abafando a voz desse preconceito. Prefiro levar comigo a voz de quem vibrou com a minha ideia.


4 – Muitas vezes, as pessoas falam coisas do tipo “ser DJ é fácil” e “É só criar uma playlist e apertar o play”. Na sua opinião, qual a idéia mais errada que as pessoas tem da profissão de DJ?


Assim, as pessoas construíram essa ideia por falta de informação e também, muitas vezes, por exemplo de maus profissionais, mas isso existe em qualquer profissão e sempre vai ser chato quando alguém reduzir um trabalho dessa forma. O trabalho que o povo vê lá na pick-up é uma fatia mínima do tanto que a gente faz pra apresentar aquilo. Pra mim o mais equivocado sempre vai ser a ideia de que a pessoa escolheu ser DJ pra ter fama e não estudar. Isso tá errado em tantos níveis. Primeiro porque qualquer área exige que o profissional estude pra não ser medíocre. Uma construção, tanto de cada música, como de um set exige uma pesquisa e um conhecimento que você tem que correr atrás e ter muito talento pra desenvolver. Segundo porque a fama vem depois de muito trabalho bom apresentado e oportunidade aproveitada. Não é só chegar, como você disse, com uma playlist e dar o play MESMO.


Foto: Vitor de Freitas


5– Obviamente estamos vivendo um momento atípico, onde festas não estão acontecendo por causa da pandemia. Quando tudo voltar ao normal, o que poderemos esperar de você? Quais são seus planos, sonhos e ambições para a La Trisha?


Eu quero conquistar o mundo, baby! Depois de abertas as festas vai ter toda a ferveção retroativa que eu to acumulando. A pandemia me deixou parada, mas não morta. O ranço passado em casa deve ser e será exaltado! Já tive a honra de realizar o sonho de tocar em casas que eu AMO o trabalho, mas tem muita casa e selo no Brasil pra me notar. Fora do país eu to querendo e me mexendo pra que eu possa (parafraseando o jogo War) conquistar 24 territórios. Tem muita coisa pra acontecer e eu só posso dizer que estou e vou continuar fazendo o impossível pra que o tagaragadá dessa bicha aqui ecoe em cada ponto que aparecer o arco-íris!


Lembrando que Junho está acabando, mas o orgulho não. Sejamos todos como La Trisha. Vamos celebrar a união, o respeito e a igualdade. Sempre.


Não deixem de acompanhar os próximos posts! Abraço!


Vitor de Freitas


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